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Postado dia 24/01/2023 às 17:38:10

Automação em julgamentos chega aos tribunais dos EUA e da Estônia

Na Estônia, cidadãos já podem ir à Justiça para questionar pequenas causas contratuais perante um... computador. Nos EUA, dois casos  serão disputados na Justiça pela primeira vez, em fevereiro, com "assistência jurídica" de programas de inteligência artificial, fazendo o papel de advogados.

Os dois casos em disputa nos EUA são de multa de trânsito por excesso de velocidade. Uma audiência será pessoal, em uma corte, e a outra por Zoom. Até agora, os programas de automação só haviam ajudado motoristas a questionar multas de estacionamento, em procedimentos administrativos — não em cortes. E contas de companhias de TV a cabo.

Na Estônia, só podem contar com inteligência artificial (IA) os julgamentos de casos com valor inferior a 7 mil euros. As duas partes em uma disputa fazem o upload no sistema de suas informações relevantes e o programa emite uma decisão. Mas uma parte inconformada pode recorrer a um juiz humano. Já existem no país 100 "robôs" exercendo essa função.

Vantagens e desvantagens

Um estudo conjunto de seis organizações australianas aponta vantagens e desvantagens da utilização de funções alimentadas por inteligência artificial nas cortes. Os pesquisadores encontraram duas vantagens principais na experiência da Estônia: 1) ajuda os juízes a reduzir o acúmulo de processos; 2) libera os juízes para cuidar de casos mais complexos.

Outra vantagem prática vem da China. Com o processamento de linguagem natural, através de inteligência artificial, os tribunais conseguem converter para texto, automaticamente, tudo que é falado pelos juízes, advogados, promotores e testemunhas. Assim, o tribunal disponibiliza, em tempo real, transcrição em mandarim e inglês de julgamentos, o que ajuda, principalmente, pessoas com deficiência auditiva.

Entre as desvantagens de implementar esses sistemas de IA nas cortes, estão os fatos de que: 1) eles levantam preocupações sobre compatibilidade com os valores fundamentais da operação do Direito; 2) retiram da justiça o elemento humano e, portanto, a autoridade moral e a discricionariedade dos juízes para aplicar a lei; 3) dado a natureza secreta dos sistemas de IA, os juízes e as partes ficam sem saber como as decisões foram geradas.

O estudo australiano critica, principalmente, o sistema de IA utilizado por cortes dos EUA, o COMPAS (Correctional Offender Management Profiling for Alternative Sanctions). Juízes usam essa ferramenta para decidir sobre fixação de fiança e sobre livramento condicional, com base em dados que expõem riscos de reincidência ou de fuga, em vez de um perfil psicológico do réu e outros procedimentos humanos costumeiros.

Também é um fato que os modelos de inteligência artificial têm um problema de idioma. Foram criados para entender a língua inglesa correta e clara. Podem não entender, por exemplo, a fala com sotaque ou mal pronunciada de réus não nativos ou, ainda, repleta de gírias. E, certamente, não entendem outros idiomas.

Além disso, já foi observado que o sistema e preconceituoso contra certos grupos raciais. Por exemplo, uma investigação de jornalistas do site Pro-Publica, que examinou cerca de 10 mil casos criminais na Flórida, revelou que réus negros foram apontados muito mais vezes como "alto risco" (de reincidência, etc.) do que réus brancos, que foram apontados como de "baixo risco", apesar de isso não corresponder à verdade.

Auxílio artificial

Uma característica da inteligência artificial que faz as vezes de advogado é a de que ela não tem a eloquência sempre apreciada pelos advogados de verdade: ela sussurra o texto no ouvido do réu, que tem de usar um dispositivo de ouvido com Bluetooth e repetir, palavra por palavra (verbatim), tudo que a máquina "soprar".

A máquina, que usa a tecnologia GPT (Generative Pretrained Transformer) da OpenAI, pode ter, no futuro, algum valor comercial nos EUA, país em que é muita alta a taxa de cidadãos que fazem a autodefesa (pro se), principalmente em ações civis.

Mas a startup DoNotPay, empresa que criou a máquina, ainda não colocou seu produto no mercado e não há previsão de quando poderá fazê-lo. Por enquanto, o único público-alvo da empresa é a categoria de juízes.

Isso porque, de maneira geral, as cortes proíbem o uso de inteligência artificial — e fones de ouvido habilitados por Bluetooth — nas salas de julgamento. A DoNotPay espera que, com o esperado sucesso do que vêm chamando de "robô-advogado", as cortes mudem suas regras.

A empresa também teme a reação da ABA (American Bar Association). Anunciou apenas que os dois julgamentos serão em fevereiro, mas não revelou em que jurisdição, data e horário, tampouco a identidade dos réus, para que a seccional local da ABA não interfira na atuação de seu "robô-advogado", antes que ele seja testado em um julgamento real.

A DoNotPay ofereceu aos dois réus voluntários garantia de pagamento das multas e outros custos judiciais, caso percam a causa.

Com informações da USA Today, The Register, People e dos sites australianos LSJ online e UNSW Sydney.


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