Apesar de sermos representantes de organizações suprapartidárias (o Instituto Vamos Juntas e o Vote Nelas), ecoando vozes de mulheres muito diversas pelo Brasil, não dá para negar os danos profundos do atual governo para as mulheres. As armas de fogo foram ostensivamente liberadas pelo governo Bolsonaro e as maiores vítimas foram mulheres. Fomos o país que mais perdeu mulheres grávidas e puérperas para a covid-19 no mundo todo.
A gestão cortou 90% da verba disponível para ações de enfrentamento à violência contra a mulher durante seu mandato. Apenas um terço dos recursos previstos para políticas para mulheres desde 2019 foi utilizado. Para 2023, a verba de ações para mulheres foi cortada em até 99%.
A luta dos movimentos sociais foi árdua, mas tivemos conquistas importantes, como o PL dos Absorventes, que buscava combater a pobreza menstrual. No domingo, um novo capítulo se iniciou para as mulheres brasileiras e com ele, oportunidades em avançarmos em pautas relevantes para todas nós.
Em seu plano de governo, Lula amplamente cita ações para o público feminino como a recriação do Ministério da Mulher, combate à violência e fortalecimento ao SUS para as mulheres, também se comprometeu em trabalhar para diminuir os retrocessos históricos do Brasil contra negros, indígenas e mulheres. No entanto, em sua campanha, Lula hesitou em se comprometer com a formação de um ministério paritário. Em 2010, o presidente eleito deixou seu governo com quatro mulheres apenas entre os 28 ministros, mas precisamos e queremos mais.
Outros países da América Latina já avançaram muito na questão da paridade de gênero. O Chile construiu um ministério paritário, com 14 mulheres e dez homens, que compõem o governo do presidente eleito este ano. Na Espanha, as mulheres são 63% do ministério. Em 2019, as congressistas mexicanas foram além: unidas, aprovaram uma reforma que alterou um artigo da Constituição e instituiu a obrigatoriedade de que 50% dos cargos públicos sejam ocupados por mulheres nos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, nos órgãos federais, estaduais e municipais, além de órgãos autônomos (tanto cargos concursados como comissionados). Os países que avançaram na paridade também já demonstraram conquistas na luta pelos direitos das mulheres: as argentinas aprovaram a descriminalização do aborto.
O resultado das eleições deste ano na composição do Congresso Nacional foi preocupante, não alcançamos nem sequer 20% de representatividade feminina e seguimos abaixo da média mundial de 25%. Tivemos retrocesso no número de mulheres negras eleitas: perdemos cinco cadeiras. Tivemos inclusive retrocesso de representatividade no Senado.
Fatos e números tão aterradores, que nos trazem o incômodo de sermos maioria populacional (52% da população) mas ainda minoria sub representada, como se fôssemos cidadãs de segunda categoria. Acreditamos que o fortalecimento da democracia acontece quando metade da população é incluída na construção do futuro do país.
Mulheres representam o desafio ao status quo, a pluralidade de opiniões – diversidade tão importante na elaboração de políticas públicas mais assertivas, que abraçam toda população. A questão da “perspectiva própria” é fundamental no processo de elaboração de políticas públicas. É urgente que o público-alvo das políticas públicas seja mulheres, população negra ou LGTBQI+ e que cada um desses extratos populacionais esteja presente na elaboração das leis.
Este novo momento do país pede oxigenação e as lideranças femininas estão prontas para assumir cargos ministeriais nos campos de atuação desafiadores, como a economia, o meio ambiente, a educação, a agricultura etc. Nos próximos dias, construiremos colaborativamente uma lista com sugestões de profissionais mulheres para o ministério, nas páginas dos projetos (@vamosjuntasorg e @votenelas), além da contribuição da sociedade civil organizada. Finalizadas nossas indicações, encaminharemos para apreciação da equipe de transição do novo presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva.
Somos muitas, somos diversas e estamos prontas.
* Larissa Alfino, presidente do Instituto Vamos Juntas, movimento nacional e suprapartidário que já apoiou mais de 200 candidatas e tem 21 parlamentares eleitas pelo Brasil.
* Gisele Agnelli, cofundadora do Vote Nelas, movimento suprapartidário com núcleos pelo Brasil inteiro que visa o reconhecimento das mulheres como força política.