Política

Postado dia 24/10/2021 às 14:54:40

'Tratoraço’ recebeu verbas públicas destinadas por 30 parlamentares

Uma investigação com base em planilha interna do Ministério do Desenvolvimento Regional e um relatório da Controladoria-Geral da União (CGU), rastreou, porém, os nomes de políticos que enviaram verbas federais para compras sob suspeita de sobrepreço. No grupo de 30 parlamentares identificados estão o líder do PSL na Câmara, deputado Vitor Hugo (GO); o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), ex-presidente do Congresso; e o relator-geral do Orçamento de 2020, deputado Domingos Neto (PSD-CE).

A planilha do Desenvolvimento Regional, obtida pela reportagem, mostra que todos solicitaram repasses para prefeituras, aprovados em dezembro passado, com recursos de emendas do relator-geral, artifício do orçamento secreto. Resultado: o ministério celebrou 74 convênios classificados pela CGU, em relatório de auditoria recentemente divulgado, como tendo “risco alto ou extremo” de sobrepreço.

O Estadão chegou à lista dos 30 nomes cruzando dados da planilha e do relatório. A autoria continua sigilosa até para órgãos de controle e fiscalização. A não ser que haja um vazamento de informação, a sociedade não tem como saber quem impôs ao governo uma determinada compra com recursos do orçamento secreto. O anonimato garante que parlamentares não sejam associados a eventuais casos de corrupção no uso dessas verbas.

Os valores a mais identificados nos convênios ligados a esses políticos passam de R$ 6 milhões. Trata-se, porém, de apenas um pedaço dos R$ 142 milhões em sobrepreços identificados pela CGU em licitações e convênios do Desenvolvimento Regional, com recursos do orçamento secreto.

O relatório da CGU foi feito após o Estadão revelar, em maio, que o ministério comandado por Rogério Marinho foi o destino de R$ 3 bilhões em emendas de relator-geral e parte desse dinheiro foi para dezenas de convênios com indícios de irregularidades. Com base no relatório, a CGU notificou prefeituras apontando “suspeita de superfaturamento” nesses convênios para compra de maquinários.

Presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Davi Alcolumbre – que hoje dá dor de cabeça ao governo por não marcar a sabatina de André Mendonça para o Supremo Tribunal Federal – apresentou quatro propostas de convênios para compras de máquinas a municípios do Paraná, todas com sobrepreço. No primeiro, a aquisição de tratores para Godoy Moreira, a CGU concluiu que o custo previsto, de R$ 255 mil, está R$ 100 mil acima do valor de referência. Uma diferença de 65%.

As emendas de relator-geral vêm sendo usadas pelo governo Bolsonaro para distribuir bilhões de reais a parlamentares em troca de apoio no Congresso, como revelou o Estadão. Em audiência na Câmara, no último dia 7, o ministro da CGU, Wagner Rosário, disse “não ter dúvidas de que há corrupção na ponta”.

No esquema do orçamento secreto, além de indicar a cidade beneficiada, os políticos receberam o aval do governo Bolsonaro para determinar o que deveria ser comprado e até o valor dos produtos, em conversas por WhatsApp com ministros, pessoalmente ou por ofícios que não são públicos.

O governo tem se recusado a fornecer informações nos casos envolvendo compras com cifras a mais. Dessa forma, mantém o sigilo sobre o tipo de exigência feita pelos 30 parlamentares que indicaram compras em convênios que registraram sobrepreço. Os congressistas também preservaram essas informações.

O ex-ministro da CGU Valdir Simão observou que é tarefa do parlamentar “zelar para que o processo de compra seja eficiente e transparente”. A opinião é compartilhada por Gil Castelo Branco, da ONG Contas Abertas. “As motivações do sobrepreço devem ser investigadas. Eventualmente, poderão existir relações entre a empresa, o prefeito e o parlamentar.”

Procurado, o Ministério do Desenvolvimento Regional disse que determinou a suspensão de todos os convênios objetos de apontamentos da CGU. “Os procedimentos de formação de preço de referência são realizados pelos entes conveniados (prefeituras), sem participação do ministério nessa fase”, destacou. A pasta afirmou ainda que está em contato com os municípios, demandando ajustes nos processos e adequações às recomendações da Controladoria-Geral da União, “de maneira que os riscos de sobrepreço sejam minimizados”.

A seguir os parlamentares envolvidos no "tratoraço":

Bozzella (PSL-SP)
Bosco Saraiva (Solidariedade-AM)
Darci de Matos (PSD-SC)
Davi Alcolumbre (DEM-AP)
Delegado Antônio Furtado (PSL-RJ)
Delegado Waldir (PSL-GO)
Domingos Neto (PSD-CE)
Edna Henrique (PSDB-PB)
Eduardo Costa (PTB-PA)
Expedito Netto (PSD-RO)
Fabio Schiochet (PSL-SC)
Felicio Laterça (PSL-RJ)
Flaviano Melo (MDB-AC)
Francisco Jr. (PSD-GO)
Giovani Cherini (PL-RS)
Juarez Costa (MDB-MT)
Lucas Redecker (PSDB-RS)
Leo Moraes (PODEMOS-RO)
Luciano Ducci (PSB-PR)
Lúcio Mosquini (MDB-RO)
Luiz Carlos (PSDB-AP)
Mara Rocha (PSDB-AC)
Marlon Santos (PDT-RS)
Maurício Dziedricki (PTB-RS)
Ottaci Nascimento (Solidariedade-RR)
Sargento Fahur (PSD-PR)
Soraya Manato (PSL-ES)
Vitor Hugo (PSL-GO)
Zé Silva (Solidariedade-MG)
Zequinha Marinho (PSC-PA)

 

Outro lado

O deputado Sargento Fahur (PSD-PR), que indicou compra de máquinas para Umuarama, disse que se houver irregularidade deve ser investigada. O trator agrícola orçado no convênio ficou 39% acima da referência da CGU. “É importante se atentar para distinguir o que realmente é sobrepreço e o que é aumento de preço por conta da inflação e outros fatores”, disse.

O deputado Luciano Ducci (PSB-PR) primeiro disse que desconhecia “totalmente o assunto”. Depois de fazer contato com a equipe, ele confirmou a indicação. Disse que se informou com a prefeitura de Rio Negro que a pesquisa de preços foi feita de maneira correta. Segundo ele, o repasse federal no convênio era de apenas R$ 200 mil, menos do que o custo da máquina, e o município completará até R$ 295 mil.


comente esta matéria »

Copyright © 2010 - 2024 | Revelia Eventos - Cornélio Procópio - PR
Desenvolvimento AbusarWeb.com.br